Gastar mais em processos não converte imediatamente para quanto o consumidor está disposto a pagar. Saiba o que penso a respeito.
Esta semana escutei na rádio a entrevista do Diretor de uma renomada instituição falando do trabalho realizado para um prestigioso produto da culinária Amazônica. A inovação é transformar o insumo fresco em uma conserva, para ampliar a durabilidade, escala e potencial de exportação. Na ocasião, convocou empresas interessadas para incorporar este processo à sua produção, prometendo algo grandioso e com visão de futuro.
Fiz um paralelo mental entre o preço e valor percebido da matéria-prima em questão fresca, comparando com os similares em conserva – categoria que esta inovação pleiteia. O quilo do insumo fresco é R$ 60,00 – chegando a R$ 90,00 com um beneficiamento mínimo – culturalmente aceito e celebrado. A média dos similares em conserva é R$ 40,00/quilo. Por mais que a matéria-prima seja Amazônica e tida como especial, os produtos enlatados desta categoria (e muitas outras) naturalmente depreciam a percepção de valor para o público. É diferente quando este processo agrega uma receita ou sabor melhor que o original innatura – o que não é este caso.
Verticalizar e beneficiar produtos tem sido a tônica de muitas indústrias e Governos – pensando prioritariamente em dar destino aos insumos e proporcionar ampliação de mercado. Porém, pouco é pensado na ampliação do consumo interno, ou na atração mais consistente de visitantes para experimentar nossos produtos aqui – no território Amazônico. Enquanto isso, paraenses de classes mais abastadas seguem priorizando insumos importados de outros estados e países, em todos os segmentos. E nossos produtos seguem suprimidos e com pouco espaço nas prateleiras do varejo especializado.
Existe um caminho pra reverter isso? Ao longo de uma década e meia de atendimento a empreendedores e grupos organizados com produtos do bioma Amazônico, percebi uma recorrência nos dilemas. Muitos precisavam explicar “porque era mais caro que o normal” – seu processo orgânico e cuidadoso; outros dizem ter “dificuldades de competitividade”; e a grande maioria se queixando ter “margens muito pequenas” em suas vendas, muitas vezes estrangulados por atravessadores ou concorrência desleal.
Por conta de tudo isso, estamos na Libra Branding finalizando a construção de uma ferramenta chamada Valorigem. Seu intuito é organizar os valores Atribuídos presentes e possíveis de uma oferta (História, Cultura, Território, Saber Ancestral, Conhecimento – e muito mais) e transformá-los em valor Percebido. Neste processo, podemos atribuir ainda mais valores com incremento técnico e estratégico – com Design, Experiências Sensoriais, Aperfeiçoamento de marca e embalagem, Comunicação, entre outros. Muitos produtos não conseguem conversar sozinhos com os consumidores, e este é o grande desafio.
Não podemos “cobrar caro” por algo se o consumidor não estiver disposto a pagar mais por isso. E neste ponto entra a compreensão de quais valores percebidos são importantes para o público – e a maioria deles, para a grande massa, não está presente na matéria-prima e benefícios diretos, como muita gente pensa. A Percepção de Valor está no Prazer que este produto causa; no Status que agrega a quem o utiliza; na Notoriedade desta marca ou item; no Estilo de Vida que promove; na Familiaridade que consegue ter com os produtos que fazem parte do dia-a-dia das pessoas.
Aí neste ponto você poderia me questionar: “Então queres propor aos produtos com origem Amazônica o mesmo papel hedonista que o capitalismo médio impõe!”. Bom, apenas no que tange o comportamento de consumo convencional. É sabido que a sociedade do sentido contemporânea espera perceber outros valores menos individualistas – como Sustentabilidade, Justiça Social, Transparência, Ética, Inclusão…então o desafio é cruzar as informações do que podemos agregar com o que o público efetivamente espera, nas duas direções.
Complementar ao que escrevo aqui, meu amigo Rogerio Ruschel cunhou brilhantemente o conceito de Duplo Branding, que afiniza bastante com minhas teses – e julgo serem bastante contributivos para o mercado nacional e internacional dos produtos do Pará (e do Brasil também!). E que essa expansão respeite aspectos culturais dos dois lados – além da Ancoragem e Tensionalidade dos preços dos segmentos e categorias de cada produto. Não há fórmula mágica: é preciso entender a relevância, construir com consistência, e ser efetivo nas negociações e resultados.
Por Berna Magalhães – Fundador e Diretor de Criação e Sentido na Libra